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A morte e a Chapada Diamantina

por nov 2, 2025Estilo de Vida0 Comentários

Uma reflexão sobre a leveza que a região nos traz para os momentos de luto

Morte não se supera.

Certa vez, enquanto produzia um vídeo para o meu canal, me deparei com essa afirmação. Ela veio de um grande observador das relações humanas: Manoel Carlos. O famoso autor de TV diz que não entende o que significa a tal superação, apregoada por muitos. “Seria esquecer quem se foi?”, questiona o novelista.

Concordo com o veterano dramaturgo.

Eu nunca superei uma morte. Nem mesmo a daqueles desconhecidos que fotografei durante anos. Volta e meia, me pego pensando em cada par de olhos macilentos e pupilas dilatadas que me encaravam pelas lentes da câmera da polícia técnica (e tétrica). Para o Estado, os olhares viravam arquivos; para mim, se tornavam memórias soturnas e constantes.

Então veio a mudança para a Chapada Diamantina. E constatei de novo que morte não se supera. Mas é possível, sim, torná-la mais suportável.

Nesta terra mágica, a natureza me ensinou a pintar a finitude e as rupturas com cores mais brandas.

Sua geografia é como um mundo paralelo que me alivia e me ajuda a vislumbrar o fim e as perdas com mais leveza.

Flores que não morrem

Sempre-viva. Preste bastante atenção neste substantivo composto. Lindo, simples, profundo. Representa bem o que essa planta abundante na Chapada  é: uma flor que não perece mesmo depois de colhida. Nem a morte pode destruir sua beleza, sua função, sua história. A sempre-viva é como uma alma imortal.  

Mortos sempre lembrados

Em 2 de novembro, desde o século 13, é muito comum a visitação a cemitérios. Na Chapada Diamantina, porém, há uma necrópole que está aberta o ano todo e recebe visitas diariamente: o Cemitério Bizantino de Mucugê. Passeios entre túmulos são incomuns no Brasil fora do Dia de Finados (não à toa, poucos monumentos funerários são tombados pelo Iphan). Mas os harmoniosos jazigos brancos da encosta da Serra do Sincorá são um convite constante para relembrar os que partiram e enxergar a morte com beleza, reverência e muita história.

Eu fiz um vídeo inteiro mergulhando nessa temática:

Sem medo da escuridão

Cavernas já foram muito utilizadas como tumbas pelos nossos antepassados. A Chapada, no entanto, nos convida a reinterpretar as fendas na rocha como formas de vencer o medo do desconhecido. Depois de um tempo, torna-se fascinante se lançar nas profundezas da terra.

E o pôr do sol? O aviador e escritor francês Saint-Exupéry, autor de “O Pequeno Príncipe”, dizia que “quando a gente está triste demais, adora o pôr do sol”. De modo similar, o filósofo Schopenhauer afirmava que contemplar o fim de tarde é como experimentar uma pequena morte. Aqui na Chapada, todavia, essa pequena morte é contemplada com satisfação. O ocaso é melancólico? Sim. Mas é, sobretudo, indescritivelmente belo e acolhedor.

A pequena morte do sol na Chapada: momento melancólico, mas sublime e agradável — Foto: acervo pessoal.

Apesar de todo o seu fervilhar de vida, a Chapada – pelos motivos que citei – sempre me pareceu também um lugar para pensar na morte. E ressignificá-la. Observar sua flora, seus monumentos e seus atrativos me faz integrar o fim naturalmente à minha existência e, consequentemente, enxergá-lo com mais tranquilidade.

Se morte não se supera, podemos pelo menos enfeitá-la para doer menos. E a Chapada tem sido esse meu refúgio agridoce.

Cá entre nós: não sei exatamente como funciona isso de Céu e Inferno após a morte – mas o que posso dizer é que já vivo no Paraíso há muito tempo.   

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